segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Pijamaço em Paris

Na semana de moda mais importante do mundo, grifes de luxo mostram roupas que parecem feitas para dormir

PEDRO DINIZENVIADO ESPECIAL A PARIS
Você faz o tipo que usa camisola, lingerie sexy ou um bom e velho pijamão? Quem faz essa pergunta, que pode até parecer esdrúxula, são algumas das grifes de luxo e estilistas cujas apostas são disseminadas no varejo mundial.
Rochas, Dries Van Noten, Maison Martin Margiela, Nina Ricci, Chalayan, Yohji Yamamoto e a marca símbolo desse movimento, Christian Dior, promoveram um verdadeiro "pijamaço" na semana de moda de Paris.
Esta temporada de verão 2015 só termina na próxima quarta (1º), mas já mostrou que metade dos seus principais nomes quer vestir as clientes com versões elegantes, cheias de brocados e camadas de seda ou renda, do look de cama.
1970 x 1990
O tiro é certeiro. As referências são, em sua maioria, as mesmas que permearam as temporadas de Nova York, Londres e Milão: o romantismo libertário e florido dos anos 1970 --década-chave dos desfiles na cidade italiana--, o "streetwear" dos 1990 --que definem boa parte das coleções desde a temporada passada-- e, em menor grau, o militarismo um tanto austero dos 1940.
No entanto, ao retroceder o relógio da moda até os séculos 18 e 19, épocas em que as roupas eram verdadeiras instalações de arte com detalhes minuciosos de fios de ouro e rendas do tipo chantilly, os estilistas aproximam o prêt-à-porter (o "pronto para vestir" produzido em série) da alta-costura.
Dries Van Noten criou a hippie elegante e colorida com seus pijamas meio século 19 meio anos 1970, mas foi a desconstrução do robe francês do século 18 capitaneada pelo belga Raf Simons, da Christian Dior, que alçou essa festa do pijama a baile de gala.
Simons reconstruiu o velho pensando no futuro ao misturar os casacos masculinos da realeza do século 18 com bermudas esportivas --o esporte, vale lembrar, é tendência absoluta nas passarelas-- e apostando em "camisolões" brancos com vazados de renda.
O "pijamismo" em Paris pode ser visto como extensão da macrotendência fashion desta década, o "normcore".
NORMALISMO
O conceito foi criado pela agência brasileira Box1824, do publicitário Rony Rodrigues, em parceria com o coletivo americano de arte K-Hole. O "normcore" define a onda normal, sem firulas, leve e desprendida dos padrões de consumo imediato que os jovens devem adotar em suas vidas.
Ele desemboca nessa moda sonolenta, "pijamista" e quase relaxada --não fosse o trabalho minucioso de construção da roupa, cheias de recortes e aplicações.
"Eu usaria só pijama se pudesse", confidenciou uma importante diretora de revista no pé do ouvido deste colunista. Não é só ela.
A Maison Martin Margiela, principal grife da ala "minimalista de vanguarda" da semana de moda, sabe que as transparências dos vestidos camisola e dos robes beges, amarrados na cintura e combinados com bermudas de alfaiataria, podem fazer a cabeça das modernas.
ERÓTICA
Modernas que amam os logos dos anos 1990 e, agora, podem combiná-los com as camadas de renda da camisola do século 19 com toques esportivos da grife Rochas. Um "R" estampa parte dos looks da coleção do estilista Alessandro Dell'Acqua.
O cipriota Hussein Chalayan, por sua vez, entende que, nessa volta à essência do básico, a natureza tem um papel fundamental na vida das pessoas. Em sua coleção, os "pijamas" com verde floresta fazem par com as referências à arquitetura dos mouros.
Até a grife italiana Nina Ricci se rendeu a essa festa do pijama "normcore". Mesmo tendo apostado em peças típicas dos anos 1940, como a saia justa até o joelho e blazers mais fechados, contrapõe o peso da década da Segunda Guerra com alguns vestidos rendados, quase como lingerie erótica. 

Estilista usa técnica de 3D em tecido elástico

DO ENVIADO A PARIS
As técnicas de 3D aplicadas na moda vieram para ficar. Prova disso foi o desfile da grife japonesa Issey Miyake, que levou à sua passarela de verão 2015, na sexta (26), durante a semana de moda de Paris, um tecido elástico que saltava em formato de origami do corpo da mulher.
O estilista da grife e pupilo de Miyake, Yoshiyuke Miyamae, que assumiu em 2011 a direção da marca após a aposentadoria do fundador, é mestre na construção de roupas produzidas a partir de conceitos geométricos e esteve à frente do desenvolvimento do tecido.
Sob sua batuta, a Issey Miyake produziu coleções ovacionadas pelo caráter inovador. Na temporada passada, Miyamae criou uma bolsa que, quando aberta, virava um vestido.
"O grande desafio é manter essa simplicidade, essa moda divertida que ele [Issey Miyake] pregava acima de tudo", conta o estilista à Folha.
"Nesta coleção, eu desenvolvi todos os vestidos a partir de programas de computador para ter essa exatidão do movimento e das formas."
As modelos desfilavam vestidos com relevos e recortes assimétricos perfeitamente posicionados no colo e em pontos da barra.
O "pleats please", os plissados que são o maior legado de Issey Miyake na moda, apareceram pontualmente em vestidos de cores vivas, como os que misturavam tons de laranja e amarelo.
PERFORMANCE
Em seu desfile, performático, a artista sonora japonesa Ei Wada, membro do grupo de musicistas Open Reel Ensemble, criava sons a partir de rádios vintage.
Quando acionados por ela, a partir de um piano, eles moviam balões de hélio para criar um som semelhante a um zumbido de rádio.
"Os shows têm de ser uma extensão do que você propõe compartilhar com as pessoas a partir das roupas", afirma Miyamae. Folha, 29.09.2014

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